Violência Psicológica e Emocional & Pandemia COVID-19

A pandemia COVID-19 produziu alterações profundas nas dinâmicas relacionais e familiares, conduzindo, não raras vezes, ao acentuar de conflitos pré-existentes e ao aumento significativo das situações de violência doméstica. A Organização Mundial de Saúde relata um aumento de episódios de violência doméstica na ordem dos 60%. Em Portugal, as cifras situam-se nos 70% (dados disponibilizados pela Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, Junho de 2020).

A violência não é só física. Associamos muitas vezes o termo violência ao uso da força física, algo que deixa uma marca visível para a vítima e para os outros (nódoas negras, cicatrizes, feridas ou inchaços, por exemplo). Contudo, a violência inclui qualquer forma de uso intencional da força, coação ou intimidação com a finalidade de lesar a integridade, os direitos e necessidades de outra pessoa. Numa relação abusiva nem sempre a violência física está presente. No entanto, tal não significa que o relacionamento não seja violento.

Há muitas formas de exercer violência. Por exemplo, tentar isolar a vítima dos amigos e família, (tentativas de) afastá-la do emprego, vigilância constante, imposição de regras estritas e pormenorizadas, limitações à privacidade, restrição do acesso a alimentos, roupas ou partes da habitação. A estas formas de violência chamamos violência emocional e psicológica. Este tipo de violência é mais frequente do que a violência física e igualmente grave.

Qualquer pessoa pode ser vítima de violência emocional e psicológica, independentemente sua idade, género ou profissão. Crianças, jovens, adultos e idosos, rapazes e raparigas, homens e mulheres podem ser vítimas.

O que é a violência psicológica e emocional?

A violência emocional e psicológica corresponde a um conjunto de atos verbais ou não verbais, isolados ou repetidos, utilizados de forma intencional para causar dano e sofrimento emocional e psicológico na vítima.

Quem são os agressores?

Os agressores podem ser o/a parceiro/a, um colega de trabalho, um chefe, um/a treinador/a, um pai/mãe, um irmão/irmã, um amigo/a ou um cuidador. Os agressores podem ser novos ou velhos, ter um nível educacional ou um estatuto socioeconómico baixo ou elevado e desempenhar qualquer profissão.

Comportamentos exemplificativos de violência psicológica e emocional:

  • Insultos (por exemplo, “és um/a falhado/a”, “estúpido/a”).
  • Gritar para provocar medo.
  • Desvalorizar os interesses ou as coisas que são importantes para a vítima e/ou ignorar, os seus sentimentos, preocupações, necessidades ou opiniões (muitas vezes, exigindo que a vítima pense ou sinta da mesma forma que o agressor e acusando-a de ser egoísta ou carente por expressar as suas necessidades ou desejos).
  • Desprezar, menosprezar, criticar, insultar ou humilhar a vítima, em privado ou em público, através de palavras e/ou comportamentos.
  • Ter explosões de zanga imprevisíveis, obrigando a vítima a estar sempre receosa de provocar ou se deparar com uma dessas explosões”, e começar discussões sem motivo aparente, apenas para discutir.
  • Usar um discurso culpabilizante (“tu mereces isto”, “fizeste isto a ti própria/o”, “a culpa disto tudo é tua”).
  • Difamar ou envergonhar publicamente (por exemplo, acusar injustamente de infidelidade, expor segredos).
  • Ameaçar que vai maltratar ou maltratar efetivamente os filhos, outros familiares ou amigos da vítima.
  • Perseguir no trabalho, na rua, nos espaços de lazer (stalking) e monitorizar todos os passos da vítima ou espiá-la.
  • Controlar a vítima financeiramente (por exemplo, não dar acesso à própria conta bancária, exigir a justificação de todo o dinheiro gasto).
  • Revistar objectos pessoais (agenda, telemóvel, computador, entre outros).
  • Tentar isolar a vítima de familiares de amigos (por exemplo, dizer a familiares e amigos que não pode ir a determinado evento ou inventar desculpas para não fazer parte de determinadas acções).
  • Manipular (por exemplo, fazer a vítima duvidar dos seus próprios pensamentos e do que aconteceu, manipulando a situação).

As relações são sempre abusivas quando existe alguma forma de violência. Numa relação saudável há equilíbrio, os elementos dessa relação são tratados de forma igual, com os mesmos direitos. A violência emocional e psicológica acontece em relações de intimidade, mas também entre amigos e colegas. Antecede ou acompanha, frequentemente, outras formas de violência.

A violência emocional e psicológica não se “vê”. É difícil de identificar e reconhecer. Mas gera um sofrimento profundo e duradouro nas vítimas, afetando negativamente o seu bem-estar e Saúde Psicológica.

Seja quem for a/o agressor/a, seja qual for o contexto onde ocorre a violência emocional e psicológica, A CULPA NÃO É DA VÍTIMA. Ninguém merece sofrer atos de violência.

O que fazer numa situação de violência psicológica?

Conhecer os sinais de alerta e não os ignorar. O primeiro passo para evitar uma relação de violência emocional e psicológica ou terminá-la é saber identificar os comportamentos de abuso e violência. Muitas vezes, as relações abusivas passam por fases, alternando entre períodos bons e maus. Noutros casos, a/o agressor/a tão depressa agride como, no minuto seguinte, pede desculpa e diz que está arrependida/o. É tentador inventar desculpas, pensar que afinal não é violência, mas mesmo que achemos que o agressor nos quer bem, não é uma relação saudável. Nas relações saudáveis não há violência.

1.Estabelecer limites. Reduza a exposição à/ao agressor/a tanto quanto possível. Perante uma situação de violência, não se envolva: não tente explicar, acalmá-lo/a ou desculpar-se. Afaste-se dessa situação. Lembre-se que, faça o que fizer, aos olhos do/a agressor/a não estará a agir corretamente.

2.Sair da relação ou situação de violência. Caso tome a decisão de terminar os laços com a/o agressor/a, torne claro que a relação acabou e que não olhará para trás. Mesmo quando a relação com a/o agressor/a envolve crianças, questões financeiras ou uma relação romântica é possível terminá-la e existe ajuda disponível.

3.Falar com alguém e pedir ajuda. É possível que, precisamente devido à violência emocional e psicológica sofrida tenha ocorrido um afastamento de amigos e familiares. Mas as pessoas que realmente gostam de nós podem apoiar-nos. Um Psicólogo também pode ajudar a encontrar formas de lidar com estas situações, a recuperar delas e a evitar que se repitam.

 

Fonte: Ordem dos Psicólogos Portugueses

 

Dra. Alexandra Ramos

Psicologia Clínica e da Saúde | HEURÍSTICA – Centro de Psicologia e Educação